segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Um pedacinho do livro

 Finalmente tomei coragem e comecei a escrever o livro.
Dá um nervoso danado porque nunca escrevi romance, mas estou indo aos poucos.
Resolvi mostrar um capítulo daquele que só é chamado de "O LIVRO".
Se eu sou ruim pra dar nome em música, imagine em livro.


CAPÍTULO 3

Eu vou chamar Zé Tambozeiro pra bater tambor de Angola”
Candeia

Samuel estava cansado. Tinha tocado a noite toda na festa da padroeira da cidade, ainda meio bêbado, suado, mas estava contente. 
Era o que mais gostava de fazer na vida: tocar pro santo, fosse o santo católico, fosse africano. Era um ogan desde o nascimento, sempre soube que a sua missão na terra era fazer a ligação entre os mundos, carregar no peito o peso das contas, assumir a responsabilidade. Mas ainda era moço, ainda tinha que viver o que tinha que viver antes de aceitar seu destino. Por causa disso ele se divertia sem limites. E tocava todo o dia, mesmo que fosse sozinho na beira do mar, pra sua mãe Yemanjá.
Não havia na região melhor batuqueiro que ele. Ninguém tirava o som do couro como aquele mulato magro e comprido conseguia tirar. Parecia feitiço, parecia que ele tinha alguma coisa com o tinhoso de tão danado que era..
Samuel gostava de contar nas rodas de malandragem, durante as madrugadas de farra e bebida, que quando ele nasceu o próprio Exu veio assistir o parto, exigindo pra si o menino recém nascido. Foi a sua própria mãe que interferiu porque ela não aceitaria de jeito nenhum ter filho de baixo de pé de Exu. Ainda mais ela, mãe solteira, sem pai pra ajudar a criar filho. Aquele alemão só tinha servido mesmo pra falar umas palavras embrulhadas na sua orelha, cafungado em seu pescoço, se divertido em sua cama. Tomou a estrada e nunca mais deu notícias. Era ela, Tônia, sozinha que iria ter que colocar esse menino no caminho do certo, então nem morta que ela iria deixar que Exu viesse tirar seu filho do caminho porque ela bem sabia que os filhos de Exu são difíceis de cuidar e de controlar. Não, de jeito nenhum! Então, quando viu ao pé de sua cama a figura de Exu sorrindo com os braços estendidos, gritou por seu Orixá protetor e pediu que fosse Ogum que viesse cuidar de seu filho. Gritou tanto e tão alto que lá no barracão do seu terreiro o chão tremeu porque Ogum tinha ouvido seu chamado e veio galopando,girando sua espada, num grito de guerra. Veio feliz da vida porque poder guerrear com seu irmão era sempre uma felicidade. Dizem que nessa noite dava pra ouvir o barulho do aço e do ferro batendo na batalha entre Ogum e Exu pela cabeça do menino. Era só fagulha e estilhaço de metal correndo o céu daquela noite. O resto do povo diz que foi uma chuva de meteoritos, mas quem é do axé sabe que tudo que é da natureza é o orixá mostrando sua força. O que ninguém imaginava é que a batalha demorasse tanto, mas tanto, que obrigou a Oxalá intervir e foi ele que tomou à frente e pegou pra si o pequeno Samuel.
Dizem que quando Ogum e Exu caíram no chão de cansaço, sem ninguém vencer a ninguém, se deram conta da presença de Oxalá, imenso e brilhante em sua roupa branca, sua espada reluzente e seu escudo, rindo alto com a criança em seu braço. “ Esse não é nem seu, Exu, nem seu , Ogum. Esse é meu”! E colocou no pescoço do menino um fio de contas brancas e uma pequena firma vermelha que até hoje Samuel carrega no pescoço.
Samuel jura que nunca aumentou o fio da conta, que ela cresceu conforme ele foi crescendo e que isso é coisa de Orixá. Também gosta de dizer que foi desejado por Exu, disputado por Ogum e abraçado por Oxalá. Então é por isso que ele é o melhor ogan da região e também o melhor capoeirista, e o melhor amante, e tudo que for melhor, maior e mais impressionante. Destino é destino! E mesmo falando com essa arrogância juvenil consegue ter a simpatia e tirar risos de todos que o ouvem. E assim faz a sua fama e , literalmente, deita na cama.
Mas nesta noite Samuel está cansado e sente que daqui a pouco as coisas vão ter que mudar.
Sente uma tristeza sem identificar ao certo o porquê.
Decide que amanhã mesmo iria pra beira da praia pedir orientação à Yemanjá.
Alguma coisa está pra acontecer.

6 comentários:

Unknown disse...

Kd os capítulos 1e 2?

Unknown disse...

Uma delícia de ler. cheio de imagens e sons. Quero mais.

Unknown disse...

Uma delícia de ler. cheio de imagens e sons. Quero mais.

figbatera disse...

Vamos aguardar; essa moça sabe das coisas e sabe dizê-las de modo interessante e convincente.

Rei disse...

Gostei!

Tatiana disse...

FINANCIAMENTO COLETIVO DO LIVRO
www.benfeitoria.com/brigadadeoxalá